Resenha de Morreste-me – Jose Luís Peixoto

luto é uma dor única. E também universal. E é nesse paradoxo em que mergulhamos ao ler Morreste-me, de José Luís Peixoto.

Em sua obra de estreia, publicada em 2000, o autor português fala sobre a morte de seu pai. Sobre os últimos dias que compartilharam; a vulnerabilidade, física e emocional, que a doença trouxe para a família; e, claro, a perda e todos os sentimentos que ela evoca.

Acredito que seja quase impossível não se emocionar com Morreste-me. No entanto, eu estaria mentindo se dissesse que as palavras de Peixoto me tocaram com a intensidade que eu esperava. De qualquer maneira, foi o suficiente para me levar de volta ao último encontro com a minha mãe.

Eu sei que últimos encontros nos fazem pensar em cenas tristes. Mas não é exatamente o caso aqui. Apesar de estar na UTI, minha mãe estava falante e bem-humorada. E fazia muito tempo que eu não a via assim, tão parecida com ela mesma. Quinze minutos voaram e, quando a visita terminou, ela plantou um beijo em minha testa e disse “eu te amo”.

Desde aquele dia, eu nunca deixei de sentir que nós duas sabíamos que o nosso tempo juntas também terminava ali. Então, talvez eu tenha olhado para trás antes de passar pela porta. E talvez ela tenha sorrido e acenado para mim. Uma última vez. Ou, talvez, eu tenha inventado esses detalhes como uma moldura bonita que escolhemos para deixar uma foto especial ainda mais especial.

Quando perdemos alguém que amamos muito, as lembranças e os desejos às vezes se confundem. E nossa memória toma a liberdade de guardar os momentos da forma que bem entende. Quase 14 anos depois, eu já não sei mais o que é lembrança ou desejo. E eu não me importo. Porque, se eu tivesse que apostar, eu diria que tudo isso aconteceu. Exatamente assim. E pode ser que um dia eu descubra estar errada. Mas no fundo eu sei que eu não precisaria inventar nada.

Se ela soubesse que estávamos nos despedindo, ela teria me beijado, e dito “eu te amo”, e sorrido, e acenado. Uma última vez e, ao mesmo tempo, para sempre.

Autor: José Luís Peixoto
Editora: Dublinense
Publicação original: 2000

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