Cem ou mil páginas, não importa… Stephen King é sempre capaz de nos envolver com suas histórias e transformar um pedaço de nós com suas palavras. E é isso que ele faz mais uma vez em Com Sangue. O novo livro do autor reúne quatro contos, diferentes entre si, mas com algo determinante em comum: todos são histórias ligeiramente perturbadoras e também belas, ainda que de uma maneira única e peculiar.
O livro começa com O Telefone do Sr. Harrigan, que conta a história da improvável, porém transformadora, amizade que nasce entre o menino Craig e o Sr. Harrigan. O conto é um ótimo exemplo de como King é capaz de nos vender suas ideias mais loucas e plantar a dúvida em nossa mente: e se isso realmente acontecesse? Craig é um personagem carismático, o que torna a leitura leve e fluida. Mas há também partes sinistras, que são narradas com um curioso misto de casualidade e assombro – e talvez por isso mexam tanto com o leitor.
A leitura continua com A Vida de Chuck, que, sem medo, defino como genial. A história é contada de trás pra frente e, por um tempo, não sabemos exatamente como tudo se conecta. Aos poucos, e na hora certa, entendemos a analogia criada por King – e é como se uma lâmpada se acendesse sobre a nossa cabeça! Singelo e emocionante como Ascensão, o conto se desenvolve a partir da frase célebre de Walt Whitman – “Eu sou vasto, contenho multidões” – e fala sobre os grandes pequenos mundos que são criados dentro de cada um de nós.
Com Sangue*, que dá nome ao livro, nos traz um conto eletrizante protagonizado por uma das personagens preferidas de King: Holly Gibney. Nós a acompanhamos na trilogia Bill Hodges e em Outsider, e eu fiquei muito feliz de reencontrá-la em uma história só dela e que é tão característica do autor: repleta de toques sobrenaturais, mas também de amizade e cumplicidade. Em Com Sangue, King desafia nossas crenças mais uma vez e nos faz refletir sobre o mal que existe dentro e fora das pessoas, mas de uma maneira que chega a ser reconfortante.
Por fim, chegamos a Rato, o conto sobre um escritor obcecado que se isola completamente para escrever o seu primeiro livro. Pensou em Jack Torrance, de O Iluminado? Eu também. Mas, mais uma vez, King reinventa uma premissa, explorando outras ramificações do mesmo caminho. Um “conto de fadas sombrio”, nas palavras do próprio autor, Rato aguça a curiosidade do leitor, brincando com diversas possibilidades. E quando menos esperamos, a história surpreende com o tipo de reviravolta que King adora – e nós também!
*Pessoalmente, não me importo com os pequenos spoilers que King dá de seus próprios livros. Mas, desta vez, recomendo ler Com Sangue depois da trilogia Bill Hodges e de Outsider.
Título original: If it bleeds
Autor: Stephen King
Tradutor: Regiane Winarski
Editora: Suma
Ano: 2020