O que pode ser tão incrível em uma história sobre pessoas normais?
Na escola, Connell Waldron e Marianne Sheridan estão em grupos opostos: ele, integrante da turma dos populares e a estrela do time de futebol; ela, a “esquisitona” que faz questão de não se misturar com os outros. Mas, fora do colégio, Connell é o filho da diarista que trabalha na mansão dos pais de Marianne. E é lá que os dois se permitem conhecer um ao outro e se apaixonar. Connell, porém, prefere manter a relação em segredo, e Marianne aceita.
Um ano se passa, eles estão agora na universidade. E o cenário se inverte: ela, cheia de amigos, parece ter encontrado o seu lugar; ele, inseguro, não se encaixa em sua nova vida. Quando seus caminhos se cruzam novamente, eles entendem que as mágoas pertencem somente ao passado. Mas isso não significa que novos encontros, desencontros, reencontros e ressentimentos não estejam por vir.
Em Pessoas Normais, acompanhamos Connell e Marianne durante cerca de quatro anos. Nesse período, tudo na vida deles se transforma, menos o fato de que têm um ao outro. Como amigos, amantes, amigos e amantes, mas, acima de tudo, como um refúgio, onde podem ser quem são antes mesmo de saberem quem realmente são. E ao assistirmos a essas transformações, testemunhamos também as mudanças que acontecem nos sentimentos, percepções e atitudes de cada um deles.
No início do livro, quando os protagonistas têm 17/18 anos, tudo soa de certa forma banal – como é muitas vezes, quando somos jovens. Os traumas parecem fáceis de superar, porque existe uma barreira para nos proteger. Mas, com o passar dos anos, as barreiras se mostram muito mais frágeis do que pareciam e se desfazem. É quando até o que é verdadeiramente banal se torna o suficiente para que uma avalanche despenque sobre nós, de uma vez. E com Connell e Marianne, Rooney narra esse movimento, que é tão imperceptível, com maestria, explorando-o de duas maneiras diferentes, mas igualmente reais.
Em Pessoas Normais, a autora também trabalhou a diferença entre classes sociais. A disparidade entre Connell e Marianne está nas entrelinhas das atitudes dos dois. Em alguns momentos, é motivo para desavenças e inseguranças, mesmo que os próprios personagens não percebam. E ainda que as diferenças entre eles nunca anulem os encaixes perfeitos, criam ruídos na relação.
Por mais que eu tenha amado Pessoas Normais, não acredito que seja um livro que todos vão gostar. Não existem grandes acontecimentos na trama, porque ela é exatamente o que diz ser: uma história sobre pessoas normais. Marianne e Connell se encontram e desencontram como todos nós – naquilo que nos falta, e também no que nos sobra. Se apoiam em suas jornadas pessoais, e as transformações de um refletem no outro. E é assim que, juntos, eles se tornam a liberdade de ser, partir, ficar e voltar.
E foi tudo isso que tornou Pessoas Normais incrível para mim.
Título original: Normal People
Autor: Sally Rooney
Tradutor: Débora Landsberg
Editora: Companhia das Letras
Ano: 2019