Não costumo ter pesadelos, mas, certa noite, tive um daqueles que nos dão a sensação de que algo horrível está prestes a acontecer. Na manhã seguinte, acordei com uma mensagem da minha irmã mais velha, me perguntando se estava tudo certo. Poderia ser apenas rotina, mas, para mim, foi mais do que isso: ela queria saber se eu estava bem porque, durante o sono naquela mesma noite, ela me ouviu pedindo por ajuda.
Enquanto eu assistia a The Haunting of Hill House, eu não conseguia parar de pensar nesse dia. Na verdade, eu não conseguia parar de pensar na conexão única que existe entre os irmãos. Pessoas que vêm de onde viemos e que dividem conosco as dores e delícias de ser uma família. E, para além do sobrenatural, esse é o ponto central da trama.
Não é certo dizer que The Haunting of Hill House é a adaptação de A Assombração da Casa da Colina. Isso porque a obra de Shirley Jackson foi apenas a fagulha que Mike Flanagan precisava para criar uma trama muito mais profunda, complexa e cheia de significados. Mix perfeito entre terror e dramas familiares, a série evoca o sobrenatural, flerta com a insanidade e explora o psicológico. Mas, mais do que isso, conta uma história que, de certa forma, poderia ser real. A história da família Crain.
Ótimas cenas do terror clássico não faltam em The Haunting of Hill House. Mas a série também traduz os fantasmas em “assombrações” com que todos podem se identificar: culpa, medo, remorso, arrependimentos… A série é um verdadeiro quebra-cabeça e foca em dois pontos da história dos Crain: o período que a família passou na Casa da Colina, durante a infância dos irmãos; e o presente, que é carregado de situações e sentimentos mal-resolvidos.
Mais do que trazer respostas aos espectador, o jogo entre passado e presente mostra como tudo aquilo que vemos e vivemos nos molda e nos transforma de maneira irreversível. Cada um encontra sua própria maneira de lidar com a dor e o luto, no entanto, todos criam barreiras. Feitas de defesas diferentes, mas ainda barreiras que podem protegê-los do que é ruim e também privá-los do que é bom.
Cada episódio foca em um dos Crain, e os fragmentos se encaixam e se completam, em uma metáfora perfeita à trajetória de uma família. Porque nenhuma história se escreve, tampouco faz sentido, sozinha.
A título de curiosidade…
Todos os personagens principais de The Haunting of Hill House fazem referência à Assombração da Casa da Colina: Eleanor, Theodora e Luke, por exemplo, são personagens do livro e, na série, foram transformados em três dos irmãos Crain; Shirley, a mais velha, é uma homenagem a Shirley Jackson, autora do livro; e Steven, o mais velho, é um escritor de livros de terror, assim como Stephen King (fã declarado de Shirley Jackson e de A Assombração da Casa da Colina).
[…] por um segundo eu esperei que The Haunting of Bly Manor fosse tão boa quanto The Haunting of Hill House. E esse foi o 1º passo para gostar da nova temporada da série antológica de Mike […]