“Adaptação” é uma palavra muito forte para o que a Netflix fez com Death Note. “Um filme levemente baseado” na obra de Tsugumi Ohba (e que nem deveria levar o mesmo título) seria o mais apropriado. A desnecessária ocidentalização da história se torna ainda mais despropositada quando assistimos ao filme – e o que dizer sobre a quantidade de figurantes orientais, como se fosse uma tentativa (falha) de mostrar representatividade? E a sensação que ficou foi a de que a Netflix apenas usou a premissa do Death Note para criar uma nova história.
Para começar, Light Turner, interpretado por Natt Wolff, é completamente diferente de Light Yagami. Enquanto o original é extremamente inteligente e ambicioso, o “adaptado” é raso (e histérico!) e não passa de um adolescente confuso, com sede de vingança que beira o despropósito. Ao longo dos 12 volumes do mangá, podemos acompanhar toda a transformação de Yagami, o que traz inúmeras reviravoltas à história. É verdade que a adaptação da Netflix também surpreende em alguns momentos, mas nunca por conta do comportamento de Turner.
Há que se admitir que Mia Sutton, vivida por Margaret Qualley, tem o mesmo nível de importância para o filme que Misa Amane tem para o mangá. No entanto, tanto a personalidade quanto as intenções da personagem foram completamente deturpadas. Sem falar que, divertida e cheia de peculiaridades, Misa dá o toque de humor perfeito ao Death Note original. Enquanto a genérica líder de torcida Mia não adiciona nada especial à história. Entendo que os trejeitos típicos de mangá de Misa não cairiam bem à adaptação live action e ocidental. Mas que dava para ter feito melhor, isso dava!
Ao lado de Light e Misa, o detetive L é um dos alicerces do mangá, não apenas por sua inteligência, mas também pelas excentricidades. Fiquei animada quando Keith Stanfield apareceu na tela pela primeira vez, pois os trejeitos (e a paixão por doces) estavam bem fiéis. Mas logo o personagem mostrou não ter nem um terço da frieza e do equilíbrio do L original. E, como detetive, acabou se revelando um ótimo praticante de Le Parkour.
A aparência que Ryuk teria no filme era algo que preocupava os fãs de Death Note. Mas talvez o Ryuk de Willem Dafoe seja a melhor parte da adaptação. Os efeitos visuais foram capazes de entregar um shinigami (que “death god”, o quê!!) 100% fiel ao mangá e a atuação de Dafoe não deixa a desejar. É uma pena que não se possa dizer o mesmo das intenções do personagem. Apesar de ser um shinigami, Ryuk não chega a ser mau e muito menos manipulador – totalmente ao contrário do filme.
No melhor estilo “mudanças que nunca vou entender” está o background de Light. Na adaptação, a vida tranquila e a família estruturada são substituídas por um Light órfão de mãe e em uma relação conturbada com o pai. Na verdade, acredito que isso seja uma forma de criar aquele tipo de drama que Hollywood adora e também de justificar o comportamento desequilibrado de Light. Bom, não preciso dizer que não funciona muito bem.
O Death Note original tem 12 volumes. A versão anime conta com quase 40 episódios. Já o filme da Netflix tem menos de 2 horas. Por esses números, já é possível saber que não seria possível a adaptação ter sequer um terço da profundidade do original. Com isso, personagens como Near, Mello e Rem foram sacrificados. As regras do Death Note também sofreram mudanças, algumas bastante convenientes para que a nova trama (sim, nova) fizesse sentido. Além das questões de adaptação, também não gostei da pegada Premonição do filme – mortes coreografadas e sangue gratuito -, muito menos das tentativas de arrancar risadas do espectador – na verdade, a cena em que Light encontra Ryuk pela primeira vez é digna de vergonha alheia.
E é por tudo isso que me pergunto: não seria mais fácil ter criado uma espécie de spin-off do mangá? Só espero que a adaptação da Netflix sirva de incentivo para ler o mangá e/ou assistir ao anime (que também tem na Netflix!).
Concordo! Bem lembrado, as mortes são ridículas, tudo parece explodir e se torna carne moída. Seria muito melhor retratar algumas mortes com o ataque cardíaco. Mia não combina como uma líder de torcida, ela não tem aquela emoção, alegria, fora que não lembra a Misa, talvez o que mais retratou a Misa Misa foi a obsessão pelo Light, mas ainda assim não foi totalmente, já que ela era o Kira nesse filme. Enfim, foi uma completa decepção.
Seu texto ficou muito bom!
Oi Amanda,
Obrigada!! Concordo com tudo o que você disse!! Eu já não esperava muito dessa “adaptação”, mas foi ainda pior haha!
Beijos
Vi gente falando muito mal da adaptação no Facebook. Não posso opinar muito, pois não conheço muito a obra.
Parabéns pela resenha! Realmente considero o filme “levemente baseado” no anime, achei dramático demais e não gostei nenhum pouco da trilha sonora do filme. Obrigada por falar deste filme ;)
Oi Karol, obrigada pelo comentário <3
Pois é, não deu pra engolir essa "adaptação", não! Netflix pecou feio!