Vou começar esse post com uma confissão.
Sempre me interessei por livros que abordam suicídio, e acho extremamente importante tratar do tema, principalmente entre os adolescentes. Então, quando descobri Os 13 porquês, automaticamente adicionei-a à minha lista de leituras. Acontece que, há uns 4 anos, era praticamente impossível encontrar o livro nas livrarias – e, na internet, era caro demais! Por isso, demorei para lê-lo, o que apenas aumentou minhas expectativas. No fim de 2014, decidi acabar com o suspense e comprei o e-book em inglês. E a conclusão? Me decepcionei.
E foi por isso que, admito, torci o nariz para a série da Netflix antes mesmo de assisti-la. Vi os dois primeiros episódios, que não me agradaram, e pensei seriamente em desistir. Cheguei até a escrever um post falando sobre o que tanto me incomoda na história de Hannah Baker. Mas eu sabia que não conseguiria publicá-lo sem terminar de assistir à adaptação da obra de Jay Asher. Sem sentir que eu realmente tenho alguma propriedade pra fazê-lo. E fico feliz em dizer que, 13 porquês depois, estou aqui editando a primeira versão deste post.
Mas, antes de falar sobre a série, vou explicar por que o livro me decepcionou tanto.
Não tem como negar que Os 13 porquês traz uma trama extremamente envolvente e intrigante – tanto é que fiz a leitura em um dia. Jay Asher foi muito inteligente ao contar a história sob o ponto de vista de Clay Jensen, mas sempre com a onipresença de Hannah Baker (já que as fitas são transcritas na íntegra). Também gosto de como a história foge do clichê, ao não atribuir o suicídio da garota apenas ao bullying. No entanto, a conexão de Clay e Hannah, um dos pontos cruciais da trama, não convence. E eu, pelo menos, não consegui de fato sentir a angústia e/ou a tristeza da protagonista. E isso pode passar a impressão errônea sobre o suicídio e o envio das fitas se tornem quase banais. Como se fossem pura e simples vingança. Como se Hannah Baker não passasse de uma garota egocêntrica, covarde e dramática.
E é nesse ponto que a adaptação se revela tão melhor do que a obra original. No início, a série mostra uma Hannah um pouco exagerada. No entanto, conforme as histórias vão se conectando, enxergamos a verdadeira Hannah e seus verdadeiros porquês. Sim, ela é ligeiramente egocêntrica e dramática. Também divertida e espirituosa. E tem tanto medo de se entregar, que acaba se rendendo às pessoas erradas. Em outras palavras, Hannah não é apenas vítima ou culpada. Ela é real.
Então você pode dizer que “muitas pessoas passaram pelo que ela passou e sobreviveram”. E é exatamente aí que está o X da questão: não temos como controlar ou prever a forma como os outros lidam com os acontecimentos da vida. E não somos ninguém para julgar se tal maneira é certa ou errada, justificável ou não. O que é ok para alguns pode ser demais para outros. Para Hannah, e para tantas outras pessoas da vida real, foi demais. E não há nada que possa mudar isso, uma vez que o estrago já está feito.
Li algumas críticas sobre o realismo exagerado de algumas cenas da série, principalmente a que mostra o suicídio de Hannah. E confesso que elas são realmente chocantes, desconfortáveis e dolorosas. Mas, talvez, sejam também necessárias. Mais do que “violenta” ou “real demais”, a cena em questão mostra a irreversibilidade da situação – que, por mais óbvia que seja, ganha novas proporções. Acima de tudo, como disse no começo do post, acho imprescindível falar sobre suicídio. No entanto, do que adianta discutir um assunto, se não for de maneira real e honesta? E, bem, a realidade é assim… Chocante, desconfortável e dolorosa.
Por outro lado, também há quem diga que Os 13 porquês romantiza e glamouriza o suicídio. E eu, mais uma vez, discordo. Primeiro porque a série criou um contexto, que aborda mais algumas temáticas pertinentes – como assédio (moral e sexual), a relação complicada entre pais e filhos, a (falta de) sororidade entre as mulheres, a homossexualidade e o machismo. Mas, principalmente, porque mostra como o suicídio afeta aqueles que ficam para trás. Como é difícil e doloroso sequer pensar em superar uma situação como essa.
O que sempre me preocupou em relação a Os 13 porquês é a ideia que a história pode dar às pessoas, especialmente aos adolescentes. Afinal, quando tudo parece estar fora do lugar, é tentador encontrar uma saída e ter a quem culpar. E continuo preocupada com relação a isso. Mas a verdade é que grande parte do tabu do suicídio é justamente o medo de “dar a ideia”, como se fosse uma atitude inovadora. No entanto, como tudo na vida, a série é uma via de duas mãos. Se por um lado pode fazer com que mais pessoas pensem em tirar as próprias vidas, por outro, talvez faça tantas outras pensarem sobre como suas atitudes afetam os outros.
Gostamos de fantasiar que o amor pode salvar uma pessoa do suicídio. Mas não é o amor. Não é tão simples assim. No entanto, podemos começar com um pouquinho de compaixão e empatia. Para que não cheguemos ao ponto em que precisamos ser salvos. Para não termos mais que “sobreviver” às nossas próprias vidas.
“It has to get better. The way we treat each other and look out for each other. It has to get better somehow.” – Clay Jensen
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Não canso de dizer sobre como é importante falar sobre assuntos como suicídio, depressão e saúde mental em geral com os jovens. E a literatura young adult é uma ótima oportunidade para fazê-lo. No entanto, é preciso ter muita honestidade e principalmente responsabilidade ao tratar do assunto. Suicídio não é brincadeira, não é vingança, não é legal, não é heróico. É muito sério e nunca “acontece do nada”. Infelizmente, não é tão raro que livros young adult romantizem e banalizem o assunto. Por isso, fiz uma pequena lista de obras que eu li e que falam sobre suicídio (desculpa o spoiler), mostrando diferentes pontos de vista sobre o tema.
A Lista de Ódio, Jennifer Brown
As Vantagens de Ser Invisível, Stephen Chbosky
Cartas de amor aos mortos, Ava Dellaira
Como eu era antes de você, Jojo Moyes
Perdão, Leonard Peacock, Matthew Quick
Por Lugares Incríveis, Jennifer Niven
Quem é você, Alasca?, John Green
Devastada. Foi assim que fiquei quando terminei a série, ainda não li o livro. Gostei demais do seu texto!!
Obrigada, Isabella! Fico muito feliz em saber disso, foi escrito com muito cuidado!
Também fiquei devastada… Já faz mais de uma semana que terminei, mas ainda penso bastante e, cada vez, vem um insight diferente.
Não li o livro, mas concordo bem com as tuas sobre a série. Na própria Netflix tem um especial liberado depois que você assiste a todos os episódios, e lá os criadores dizem claramente que quiseram fazer a cena do suicídio o mais dolorosa possível. Bem, acho que funcionou…
Obrigada, Expedito!
Também assisti ao especial da Netflix sobre a série, e acho que ficou tudo ainda mais claro. Um material realmente muito bem construído, e com responsabilidade!
Ná, muito obrigada por assistir a serie! Eu realmente precisava conversar com alguém sobre o tema. a serie é muito chocante e devastadora, e me fez pensar sobre o tema durante semanas. Achei ela muito bem estruturada e envolvente, e tbm amei as atuações. Fico feliz que vc tenha gostado comigo =)
Eu nem parei para pensar em incentivo ao suicídio, eu acho que a ideia era mesmo iniciar conversas sobre bullying, assedio, suicídio. Assuntos tao importantes e tão tabus que acabam em tragédia por ngm se abrir ou tentar entender o lado do outro. Tambem acho que a ideia era mostrar como nossas atitudes podem ferir os outros e isso me fez repensar muitas coisas…
Bom, acho que é isso..Acho que foi uma das melhores coisa que já assisti.
Beijos
Mari, eu que fico feliz por sempre poder compartilhar as coisas com você, mesmo que a distância!
Realmente, a série faz pensar muito não só sobre suicídio, mas sobre como o que fazemos impacta na vida das pessoas, de maneira que nem imaginamos, né? Vale a reflexão!
Beijos