Em 2014, eu estava passeando pela livraria com meu namorado, quando um livro de capa colorida, com ilustração estilo história em quadrinhos, atraiu nossa atenção. Assim que lemos o título, Quem vai ficar com Morrissey?, surgiu o interesse, já que ele é fã de Smiths e eu também gosto bastante de algumas músicas. Para a nossa surpresa, a obra era de um autor nacional, o Leandro Leal, e foi aí que ficamos curiosos demais para não levá-la para casa.
Na época, fazia muito tempo que eu não lia um livro nacional e Quem vai ficar com Morrissey? acabou sendo uma grata surpresa! Além de adorar a história e as referências à cultura pop mundial, também foi divertido ver elementos tipicamente brasileiros, como o futebol (em especial o Santos) e o cenário político. Em entrevista ao blog, Leandro falou sobre as inspirações para o livro (além de Morrissey, claro) e projetos futuros!
– Você sempre teve o sonho de ser escritor?
Comecei a contar histórias antes mesmo de aprender a escrever. Com três, quatro anos, eu desenhava personagens e inventava histórias com eles. Anos depois, essas narrativas evoluíram para o formato tradicional das histórias em quadrinhos e, também, para “livros” – histórias que escrevia e ilustrava em cadernos. Nessa época, eu queria mesmo era ser desenhista. Sonhava fazer quadrinhos, talvez animações. Depois, já adulto, decidido a trabalhar com publicidade, com criação, meu lado escritor falou mais alto que o desenhista. Entre a direção de arte e a redação, optei pela segunda. Em paralelo ao trabalho, continuei escrevendo e desenhando. Novamente o escritor prevaleceu: nas horas vagas, mais do que desenhar, eu escrevia. Durante anos, participei de dois blogs literários e mantive o meu próprio, no qual escrevia crônicas e contos. De um desses textos veio a ideia inicial de Quem Vai Ficar Com Morrissey?.
– Quais foram as suas principais inspirações e influências para escrever Quem vai ficar com Morrissey?, além do próprio cantor, claro!
A principal inspiração para o livro foram coisas que aconteceram comigo mesmo, além de histórias que ouvi de amigos. Os personagens se baseiam, além de mim, em pessoas que conheci. Literatura tem que ser verossímil. Os leitores têm que conseguir se identificar com os personagens e seus dramas, ler e ter aquela sensação de “isso já aconteceu (ou pode acontecer) comigo”. Existem alguns jeitos de se conseguir esse efeito, o meu é este. Sobre influências, muitas delas estão presentes nas páginas do livro, citadas. É toda a cultura pop que me rodeia, que me formou, da qual me alimento. São discos – de várias bandas, além dos Smiths e do Morrissey –, filmes, quadrinhos, livros e até vídeo games. Tudo isso moldou minha personalidade, o modo como percebo o mundo e como o descrevo. Ao ler QVFCM?, muitos se lembram do Nick Hornby, por se tratar de uma história de amor ambientada num cenário semelhante, também cercada por referências musicais. Um gênero que alguns chamam de literatura pop, do qual, se não foi o inventor, o autor de Alta Fidelidade é o principal expoente. Sou fã do cara, e a comparação obviamente me deixa envaidecido, mas nunca tive isso como objetivo. Enquanto escrevia, não pensava: “quero escrever como o Nick Hornby”. Gosto do estilo dele, fluido, divertido e, por vezes, até poético. Mas, quando penso em autores que realmente invejo, me ocorrem nomes como John Fante, John Irving, Jonathan Franzen, Mark Twain, Philip Roth, Paul Auster… Existe, porém, uma grande diferença entre o modo como eu gostaria de escrever e o modo como consigo escrever. (risos)
– Como surgiu a ideia de incorporar um ídolo da vida real em uma história de ficção?
O ponto de partida do livro foi o término de um longo relacionamento que tive. Assim como o Fernando à Lívia (casal protagonista de QVFCM?), eu também tinha apresentado o Morrissey e os Smiths para essa minha ex-namorada, e me perguntei o que aconteceria se eu a proibisse de continuar escutando as músicas deles. Na vida real, eu jamais poderia exigir algo assim, mas é para isso que existe a ficção, não? Como disse antes, QVFCM? surgiu primeiro como um conto, uma história que desenvolvi até chegar a um romance.
– Quais as principais semelhanças e diferenças entre você e Fernando?
Como o Fernando, eu sou paulistano (quer dizer, quase: sou de São Caetano do Sul, cidade vizinha), descendente de nordestinos. Sou fanático por música, cultura pop de um modo geral, e também pelo Santos Futebol Clube. Também estudei na Metodista… Além disso, eu e o Fernando temos em comum um modo um tanto romântico de enxergar a vida e os relacionamentos, definido pelo background cultural – meu, que emprestei para ele. Enxergo, porém, o Fernando como uma versão mais imatura, inconsequente e egocêntrica de mim mesmo. Um cara legal, mas que ainda precisa apanhar um pouco mais da vida para crescer. E olha que ele apanha bastante ao longo do livro.
– Como aconteceu o processo de publicação de Quem vai ficar com Morrissey?
Terminei de escrever o livro em 2011, mas só em 2013 fechei o contrato para publicá-lo. Mandei as primeiras páginas para algumas editoras, sem receber respostas muito animadoras. Até que soube de uma editora especializada em rock, que, além de algumas biografias de bandas, tinha a intenção de publicar ficção relacionada ao gênero: a Edições Ideal. Achei que meu livro tinha a cara da editora. Descobri que o amigo de um amigo era amigo do editor, o Marcelo Viegas, e consegui o e-mail dele. Mandei os originais para ele e, por sorte, ele também achou que QVFCM? tinha cara da Ideal.
– Você tem mais projetos a caminho ou em mente?
Estou escrevendo outro livro, já bastante avançado. Infelizmente, o trabalho não me permite trabalhar nele na velocidade que gostaria, mas devo concluir ainda este ano. É uma história muito diferente de QVFCM?, bem menos autobiográfica, mas também tem muitas referências à cultura pop e à cidade de São Paulo – um dos cenários do romance, que é meio um “road book”. Em comum com QVFCM?, também tem a narrativa não linear. Quem gostou do meu primeiro livro pode gostar, mas não garanto. Ah, também penso em pedir uma colaboração para o meu lado desenhista nesse projeto, fazer algo parecido com os meus primeiros “livros” da infância. Mas ainda não é certo.